

“A gente sempre acha que a grama do vizinho é mais verde. Brasileiro tem esse complexo de vira- lata. Mas neste momento atual da política brasileira é uma questão de sobrevivência. Não há qualidade de vida e, no geral, no Brasil a gente não tá ganhando dinheiro pra viver e sim pra sobreviver.”


Reprodução Instagram / @rayssafacanha


Viajar, conhecer o mundo, morar no exterior. Esses são alguns dos sonhos que estão no imaginário da maioria dos brasileiros. Além da busca por novas experiências, aprender uma nova língua e insatisfação com o governo são alguns dos motivos principais que fazem os brasileiros almejarem tanto morar fora do país.
Uma pesquisa feita pelo IBGE em junho deste ano mostra que 55% dentre jovens de 16 a 20 anos acreditam que o Brasil não seja um local adequado para se viver e que se pudessem, morariam fora. É o que pensa Rayssa Façanha, 27 anos, natural de Fortaleza, Ceará, que sempre quis morar fora do Brasil. “A gente sempre acha que a grama do vizinho é mais verde. Brasileiro tem esse complexo de vira- lata. Mas neste momento atual da política brasileira é uma questão de sobrevivência. Não há qualidade de vida”, argumenta.
Desde pequena, ela conta que sonhava com uma vida melhor em um outro país e que nunca sentiu o Brasil como seu verdadeiro lar: “O país de vontade já mudou muito, mas eu queria mesmo era ver neve. No Brasil, nunca me senti em casa, a palavra lar. Nunca senti que o Brasil fosse meu lar.”
Reprodução Instagram / @rayssafacanha
Mesmo formada em arquitetura em uma universidade renomada de Fortaleza, Rayssa encontrou muitas dificuldades em conseguir um emprego na sua área. Então, pouco antes de completar 27 anos decidiu se inscrever no programa de intercâmbio cultural Au Pair.
Para ser uma Au Pair é preciso mais do que apenas saber cuidar de crianças. Já que este intercâmbio é destinado a pessoas que queiram trabalhar como cuidadora infantil fora de seu país de origem, o programa exige alguns requisitos. Tais como idade entre 18 e 26 anos, ser solteira e sem filhos, ter experiência comprovada em trabalhos relacionados à crianças, boas condições de saúde e disponibilidade para morar e trabalhar fora. Dependendo do país, também é necessário ter conhecimentos básicos da língua estrangeira para a comunicação e ter carteira de motorista.
A escolha do destino foi fácil, pois Rayssa optou por um país europeu na intenção de baratear os custos. Para a Europa, não há a necessidade de fazer o intercâmbio com intermediação de uma agência, como é o caso dos Estados Unidos que só aceitam au pairs por meio de agências especializadas. Sendo assim, o país escolhido foi a Alemanha. Esse é um dos países que exigem nível básico da língua, por isso ela precisou fazer uma prova para comprovar o nível de alemão básico, chamado A1, mesmo já falando inglês e espanhol.
Reprodução Instagram / @rayssafacanha




Além disso, Rayssa precisou se deslocar até Recife, em Pernambuco, para tirar o visto alemão de trabalho, uma vez que esse serviço não é ofertado em Fortaleza. Ela conta que estava muito animada, pois iria mais uma vez deixar o país, só que dessa vez sem data para voltar. Rayssa já esteve fora do Brasil em viagem. Aos 15 anos foi aos Estados Unidos e aos 24 fez um cruzeiro pela Europa em família.
Sem o intermédio de uma agência, ela precisou encontrar a família anfitriã pela internet. O site mais utilizado atualmente é o Au Pair World e foi neste mesmo site que ela deu match com sua primeira família. Pouco depois, em março ela embarcou.
Apesar do sonho antigo de se mudar, o que mais pesou na hora da decisão final foi o atual cenário político e econômico do Brasil. Em sua opinião, o país está totalmente desprovido de qualidade de vida: “No geral, no Brasil a gente não tá ganhando dinheiro pra viver e sim pra sobreviver. Quem está construindo carreira não vai ter um dinheirinho ali no fim do mês sobrando. Você não vai conseguir ter qualidade de vida. Então não vejo qualidade de vida nesse momento lá no Brasil. Foram-se os dias que a gente teve isso no Brasil. Quem tem isso lá hoje em dia é rico.”
Rayssa conta que precisou lidar com uma nova realidade a qual nunca havia tido contato. Ela cresceu numa família com boas condições e nunca enfrentou grandes dificuldades. Mas ali, se viu vivendo em um país no qual ela fala pouco o idioma, tendo que resolver seus próprios problemas, longe da família e dos amigos. “No Brasil, eu era muito mimada quando estava na casa dos meus pais. Não sabia passar uma roupa. E hoje em dia, aqui, faço tudo por mim mesma. Eu que tenho que resolver meus ‘B.Os’. Isso que é crescer. Eu estou crescendo tudo que eu não tinha crescido durante os meus 27 anos”, reflete.



Passando por cada perrengue, ela percebeu que poderia obter um enorme crescimento pessoal. Construiu sua própria rede de apoio, fez amigos brasileiros e de outros países e agora ela se encontra em um relacionamento. “Não sinto solidão, tem uma rede de apoio muito boa. Tenho um namorado. Dei muita sorte em questão de host family, sempre me receberam bem. Aqui você tem que estabelecer as suas prioridades. A minha é juntar dinheiro. As viagens que fiz foram de baixo custo. Meu objetivo agora é mesmo juntar dinheiro para ingressar no mestrado que eu quero fazer: ou Alemanha ou Itália ou Portugal”, completa .
As diferenças de se estar no Brasil e fora dele são gritantes para a arquiteta. Segurança, poder de compra, qualidade de vida, possibilidade de novas experiências são as questões principais. Ademais, há o choque cultural que Rayssa observa durante os meses que está morando na Alemanha. Ela conta que “a adaptação com a língua ainda está sendo um pouco difícil de aprender, é uma desconstrução na maneira de pensar. Eles são muito diretos, eles falam o que estão pensando, doa a quem doer, são rudes. Eles estão acostumados a ser diretos, são frios e não há abertura para ser amigo de alemão.” No entanto, a partir do momento em que foi aceita por alguns nativos, Rayssa se sentiu acolhida.
Quando questionada sobre a possibilidade de voltar para o Brasil, a resposta é decisiva. “Pensar em voltar pro Brasil depois de morar num país assim não dá. Planos para o futuro, não temos. Estou vivendo muito o presente. Aqui é uma coisa muito incerta. O único plano é fazer mestrado.” Mas existe uma questão com a família, que apesar de tê-la apoiado a ir, só apoia a permanência por causa do mestrado no futuro.

Reprodução Instagram / @rayssafacanha
A rotina de Rayssa morando na Alemanha é muito boa. Ela estuda de manhã e trabalha à tarde. Faz o curso online de alemão, tendo duas aulas de manhã e duas depois do trabalho. Ela viaja pouco, mas passa bastante tempo com sua rede de apoio, namorado e amigos que fez.

E aconselha a quem pergunta sobre a experiência: “O conselho que dou é: se você tiver a oportunidade de fazer um intercâmbio, faça. Nem que seja pra limpar privada mesmo. O enriquecimento como ser humano, como adulto, o crescimento pessoal e como pessoa no mundo é indescritível. Eu só tenho a agradecer a essa oportunidade. Me vejo um ser humano melhor hoje em dia. Tenho zero arrependimentos. Todos os países têm suas questões boas e ruins. Não estou romantizando o processo. O fato de eu ter conseguido me virar já me transformou numa adulta melhor.”
A rotina de Rayssa morando na Alemanha é muito boa. Ela estuda de manhã e trabalha à tarde. Faz o curso online de alemão, tendo duas aulas de manhã e duas depois do trabalho. Ela viaja pouco, mas passa bastante tempo com sua rede de apoio, namorado e amigos que fez. E aconselha a quem pergunta sobre a experiência: “O conselho que dou é: se você tiver a oportunidade de fazer um intercâmbio, faça. Nem que seja pra limpar privada mesmo. O enriquecimento como ser humano, como adulto, o crescimento pessoal e como pessoa no mundo é indescritível. Eu só tenho a agradecer a essa oportunidade. Me vejo um ser humano melhor hoje em dia. Tenho zero arrependimentos. Todos os países têm suas questões boas e ruins. Não estou romantizando o processo. O fato de eu ter conseguido me virar já me transformou numa adulta melhor.”